21.7.08

A Frase.

A FRASE

O melhor texto de publicidade que eu já vi era assim: uma foto colorida de uma garrafa de uísque Chivas Regal e, embaixo uma única frase: “O Chivas Regal dos uísques”.
O anuncio é americano. Em algum anuário de propaganda, desses que a gente folheia nas agências de em busca de idéias originais na esperança que o cliente não tenha o mesmo anuário, deve aparecer o nome do autor no texto. No dia que eu descobrir quem é, mando um telegrama com uma única palavra. Um palavrão. Que tanto pode expressar surpresa quanto admiração, inveja, submissão ou raiva. No meu caso, significará tudo ao mesmo tempo. Palavrão PT segue carta explosiva PT Abraços etc.
Duvido que o autor da frase receba o telegrama. O cara que escreveu um anúncio assim não recebe mais telegramas. Não atende a porta. Não se mexe da cadeira. Não lê mais nada, não vê mais televisão, não vai ao cinema e fala somente o indispensável. Passa o dia sentado, de pernas cruzadas, com um olhar perdido. Alimenta-se de coisas vagamente brancas e bebe champanhe brut em copos de tulipa. Com um leve sorriso nos cantos da boca.
Foi o sorriso que finalmente levou sua mulher a pedir o divórcio. Ela agüentou tudo. O silêncio, a indiferença, as pernas cruzadas, tudo. Mas o sorriso foi demais.
“Bob (digamos que o nome dele seja Bob), você não vai mais trabalhar?”.
Sorriso.
“Nunca mais, Bob? Há uma semana que você não sai dessa cadeira”.
Sorriso.
“Bob, o Bill disse que seu lugar na agência está garantido, quando você quiser voltar. Mas eles não podem continuar pagando se você não voltar.”
Sorriso.
“As crianças precisam de sapatos novos. O aluguel do apartamento está atrasado. Meu analista também. Nosso saldo no banco se foi com a última caixa de champanhe que você mandou buscar”.
Sorriso.
“Sabe o que estão dizendo na agência, Bob? Que seu texto do Chivas foi pura sorte. Que foi genial, mas você não faz dois iguais àquele. Você precisa ir lá mostrar para eles, Bob. Faça alguma coisa, Bob!”
Bob fez alguma coisa, descruzou as pernas e cruzou outra vez.
Sorrindo.
A mulher tratou do divórcio sozinha. Na hora das despedidas, ele inclinou-se levemente na poltrona para beijar as crianças mas não disse uma palavra. Continua sentado lá até hoje.
Levanta-se para ir ao banheiro, trocar de roupa e telefonar para fornecedores de enlatados e champanhe. Os que ainda lhe dão crédito. O resto do tempo fica sentado, as pernas cruzadas, o olhar perdido. E o sorriso.
Uma faxineira vem uma vez por semana, limpa o apartamento (há pouco para limpar, ele não toca em nada) e vai embora. Abanando a cabeça. Pobre o Sr. Bob. Um moço tão bom.
Amigos preocupam-se com ele. A agência lhe faz ofertas astronômicas para voltar. Ele responde a todos com monossílabos e vagos gestos com o copo de tulipa. E todos vão embora, abanando a cabeça.
Contam que a mesma coisa aconteceu com o primeiro homem a escalar o Everest. Para começar, quando ele chegou no topo, no cume da montanha mais alta do Terra, ele tirou um banquinho da sua mochila, colocou o banquinho exatamente no pico do Everest e subiu no banquinho! O guia nativo que o acompanhava não entendeu nada. Se entendesse, estaria entendendo o homem branco e toda história do Ocidente. De volta à civilização o homem que conquistou o Everest passou meses sem falar com ninguém e sem olhar fixamente pra nada. Se tinha mulher e filhos, esqueceu. E tinha um leve sorriso nos cantos da boca.
Você precisa entender que quem escreve para a publicidade está sempre atrás da frase definitiva. Não importa se for sobre uísque de luxo ou uma liquidação de varejo, importa é a frase. Ela precisa dizer tudo o que há pra dizer sobre qualquer coisa, num decassílabo ou menos. Tão perfeita que nada pode segui-la, salvo o silêncio e a reclusão. Você atingiu seu próprio pico.
Bob tem duas coisas a fazer, depois de passada a euforia das alturas. Uma é voltar para a agência, mas com outro status, Por um salário mais alto, apenas perambulará pelas salas para ser apontado a novatos e visitantes como o autor da frase, aquela.
“Você quer dizer.... A frase?”
“A frase”
Outra é começar de novo em outro ramo. Com uma banca de chuchu na feira, por exemplo. Ele não precisa conquistar mais nada, é o único homem realizado do século.
Mas por enquanto Bob só olha para as paredes. De vez em quando, diz baixinho:
“O Chivas Regal dos uísques...”
E aí atira a cabeça pra trás e dá uma gargalhada. Depois descruza e recruza as pernas e bebe mais um gole de champanhe.

- Verissimo - (Verissimo mesmo, eu tenho o livro e datilografei :P )

O Sapo Não Lava o Pé - Estudo Filosófico.

Olavo de Carvalho: O sapo não lava o pé. Não lava porque não quer. Ele mora lá na lagoa, não lava o pé porque não quer e ainda culpa o sistema, quando a culpa é da PREGUIÇA. Este tipo de atitude é que infesta o Brasil e o Mundo, um tipo de atitude oriundo de uma complexa conspiração moscovita contra a livre-iniciativa e os valores humanos da educação e da higiene!

Marx: A lavagem do pé, enquanto atividade vital do anfíbio, encontra-se alterada no panorama capitalista. O sapo, obviamente um proletário, tendo que vender sua força de trabalho para um sistema de produção baseado na detenção da propriedade privada pelas classes dominantes, gasta em atividade produtiva o tempo que deveria ter para si próprio. Em conseqüência, a miséria domina os campos, e o sapo não tem acesso à própria lagoa, que em tempos imemoriais fazia parte do sistema comum de produção.

Engels: isso mesmo.

Foucault: Em primeiro lugar, creio que deveríamos começar a análise do poder a partir de suas extremidades menos visíveis, a partir dos discursos médicos de saúde, por exemplo. Por que deveria o sapo lavar o pé? Se analisarmos os hábitos higiênicos e sanitários da Europa no século XII, veremos que os sapos possuíam uma menor preocupação em relação à higiene do pé - bem como de outras áreas do corpo. Somente com a preocupação burguesa em relação às disciplinas - domesticação do corpo do indivíduo, sem a qual o sistema capitalista jamais seria possível - é que surge a preocupação com a lavagem do pé. Portanto, temos o discurso da lavagem do pé como sinal sintomático da sociedade disciplinar.

Weber: A conduta do sapo só poderá ser compreendida em termos de ação social racional orientada por valores. A crescente racionalização e o desencantamento do mundo provocaram, no pensamento ocidental, uma preocupação excessiva na orientação racional com relação a fins. Eis que, portanto, parece absurdo à maior parte das pessoas o sapo não lavar o pé. Entretanto, é fundamental que seja compreendido que, se o sapo não lava o pé, é porque tal atitude encontra-se perfeitamente coerente com seu sistema valorativo - a vida na lagoa.

Nietzsche: Um espírito astucioso e camuflado, um gosto anfíbio pela dissimulação - herança de povos mediterrâneos, certamente - uma incisividade de espírito ainda não encontrada nas mais ermas redondezas de quaisquer lagoas do mundo dito civilizado. Um animal que, livrando-se de qualquer metafísica, e que, aprimorando seu instinto de realidade, com a dolcezza audaciosa já perdida pelo europeu moderno, nega o ato supremo, o ato cuja negação configura a mais nítida - e difícil - fronteira entre o Sapo e aquele que está por vir, o Além- do-Sapo: a lavagem do pé.

Filmer: Podemos ver que, desde a época de Adão, os sapos têm lavado os pés. Aliás, os seres, em geral, têm lavado os pés à beira da lagoa. Sendo o sapo um descendente do sapo ancestral, é legitimo, obrigatório e salutar que ele lave seus pés todos os dias à beira do lago ou lagoa. Caso contrário, estará incorrendo duplamente em pecado e infração.

Locke: Em primeiro lugar, faz-se mister refutar a tese de Filmer sobre a lavagem bíblica dos pés. Se fosse assim, eu próprio seria obrigado a lavar meus pés na lagoa, o que, sustento, não é o caso. Cada súdito contrata com o Soberano para proteger sua propriedade, e entendo contido nesse ideal o conceito de liberdade. Se o sapo não quer lavar o pé, o Soberano não pode obrigá-lo, tampouco recriminá-lo pelo chulé. E, ainda afirmo: caso o Soberano queira, incorrendo em erro, obrigá-lo, o sapo possuirá legítimo direito de resistência contra esta reconhecida injustiça e opressão.

Kant: O sapo age moralmente, pois, ao deixar de lavar seu pé, nada faz além de que atuar segundo sua lei moral universal apriorística, que prescreve atitudes consoantes com o que o sujeito cognoscente possa querer que se torne uma ação universal.

Nota de Freud: Kant jamais lavou seus pés.

Freud: Um superego exacerbado pode ser a causa da falta de higiene do sapo. Quando analisava o caso de Dora, há vinte anos, pude perceber alguns dos traços deste problema. De fato, em meus numerosos estudos posteriores, pude constatar que a aversão pela limpeza, do mesmo modo que a obsessão por ela, podem constituir-se num desejo de autopunição. A causa disso encontra-se, sem dúvida, na construção do superego a partir das figuras perdidas dos pais, que antes representavam a fonte de todo conteúdo moral do girino.

Jung: O mito do sapo do deserto, presente no imaginário semita, vem a calhar para a compreensão do fenômeno. O inconsciente coletivo do sapo, em outras épocas desenvolvido, guardou em sua composição mais íntima a idéia da seca, da privação, da necessidade. Por isso, mesmo quando colocado frente a uma lagoa, em época de abundância, o sapo não lava o pé.

Hegel: podemos observar na lavagem do pé a manifestação da Dialética. Observando a História, constatamos uma evolução gradativa da ignorância absoluta do sapo - em relação à higiene - para uma preocupação maior em relação a esta. Ao longo da evolução do Espírito da História, vemos os sapos se aproximando cada vez mais das lagoas, cada vez mais comprando esponjas e sabões. O que falta agora é, tão somente, lavar o pé, coisa que, quando concluída, representará o fim da História e o ápice do progresso.

Comte: O sapo deve lavar o pé, posto que a higiene é imprescindível. A lavagem do pé deve ser submetida a procedimentos científicos universal e atemporalmente válidos. Só assim poder-se-á obter um conhecimento verdadeiro a respeito.

Schopenhauer: O sapo cujo pé vejo lavar é nada mais que uma representação, um fenômeno, oriundo da ilusão fundamental que é o meu princípio de razão. A Vontade, que o velho e grande filósofo de Königsberg chamou de Coisa-em si, e que Platão localizava no mundo das idéias, essa força cega que está por trás de qualquer fenômeno, jamais poderá ser capturada por nós, seres individuados, através do princípio da razão, conforme já demonstrado por mim em uma série de trabalhos, entre os quais o que considero o maior livro de filosofia já escrito no passado, no presente e no futuro: O mundo como vontade e representação.

Aristóteles. O [sapo] lava de acordo com sua natureza! Se imitasse, estaria fazendo arte. Como [a arte] é digna somente do homem, é forçoso reconhecer que o sapo lava segundo sua natureza de sapo, passando da potência ao ato. O sapo que não lava o pé é o ser que não consegue realizar [essa] transição da potência ao ato.

Platão: O sapo que vemos é nada além da corruptela do sapo ideal, que a alma conheceu antes da Queda. O sapo ideal lava seus pés eternos com esponjas imutáveis, num mundo sem movimento. O sapo imperfeito, porém, jamais lava os pés.

Diógenes de Laércio: Foda-se o sapo, eu só quero tomar meu sol.

Parmênides de Eléia: Como poderia o sapo lavar os pés, ó deuses, se o movimento não existe?

Heráclito de Éfeso: Quando o sapo lava o pé, nem ele nem o pé são mais os mesmos, pois ambos se modificam na lavagem, devido à impermanência das coisas.

Epicuro: O sapo deve alcançar o prazer, que é o Bem supremo, mas sem excessos. Que lave ou não o pé, decida-se de acordo com a circunstância. O vital é que mantenha a serenidade de espírito e fuja da dor.

Estóicos: O sapo deve lavar seu pé segundo as estações do ano. No inverno, mantenha-o sujo, que é de acordo com a natureza. No verão, lave-o delicadamente à beira das fontes, mas sem exageros. E que pare de comer tantas moscas, a comida só serve para o sustento do corpo.

Descartes: nada distingo na lavagem do pé senão figura, movimento e extensão. O sapo é nada mais que um autômato, um mecanismo. Deve lavar seus pés para promover a autoconservação, como um relógio precisa de corda.

Bobbio: existem três tipos de teoria sobre o sapo não lavar o pé. O primeiro tipo aceita a não-lavagem do pé como natural, nada existindo a reprovar nesse ato. O segundo tipo acredita que ela seja moral ou axiologicamente errada. A terceira espécie limita-se a descrever o fenômeno, procurando uma certa neutralidade.

- Internet -

Between the Bars

As vezes me canso daqui, de suas limitações, da sua falta de opção, de ir sempre aos mesmos bares, tudo sempre do mesmo jeito. Gostaria de ir a todos os bares do mundo, provar de todas as cervejas, todas as vodkas. Sentar-me onde grandes nomes da cultura sentaram. Ter o mesmo ponto de vista que algum grande nome da música teve ao compor alguma música que me acompanha até hoje. Ouvir outras coisas, sentir, ver. Ir ao grande bar da moda. Ver outras pessoas. Mas do que vale tudo isso, se o que vale numa roda de bar, é justamente a roda de pessoas? Sempre disse que o que importa não é o bar, são as pessoas que estão comigo. Por que procuro a satisfação além, se ela está sempre aqui, do meu lado, sempre quando eu quero? No fim esses outros bares tão especiais, se tornaram especiais porque pessoas especiais viveram momentos especiais. Mas sentar num bar desses, sem uma mesa recheada de pessoas que amamos, faz dele só um bar, com mesas e cadeiras diferentes, uma decoração, um estilo. Nada muito especial. Um bar cheio, mas vazio na alma.

- Dudu -

16.7.08

Sobre lê-se-onar

Sala de aula. Grande e representativo ponto de interrogação no quadro.
Algumas tentativas lúdicas de explicar como sinalizar uma questão.
Não tão óbvio pros pequenos, de pouco mais de três verões.

Pequeno e intrigado, Pedro pergunta a razão de eu ter desenhado um grande S dançando, em cima de uma bola.

É, Pedro.

Então.

Uma pergunta, assim como essa que você fez, agora.

Mas Pedro, eu queria te dizer que esse S fugido, vai ser você, um dia. Muitos dias.

Queria te contar que ando cheia desses Ss por dentro, eles são uma dança só, entre saltos, que eu mando parar, mas são surdos, e além disso nem um pouco coreografados, sabe Pedro, tem sido péssimo.

Mas também não é tão ruim, desculpa. Não vá se assustar, disso tudo também já saiu muita coisa boa, dessas interrogações nasceram invenções, revoluções, mudanças, e quem sabe um dia pra mim elas sirvam pra mais do que escrever um texto, um texto, um texto.

Queria te contar das ciladas que me enfiei por causa delas, que ontem a noite foi dura e que eu acordei mais ainda, e que elas se multiplicam, lembra daquele filme dos Gremlins? Com certeza não, mas enfim, resumindo, eram bichinhos que quando eram mortos, não morriam, se multiplicavam.

É assim que funcionam, essas bolas que pulam, pulam, pulam, vão pular em você como quando a gente afoga em piscina de bolinas (isso você conhece), mas nesse caso as bolinhas ficam pretas e se mexem sozinhas e crescem e sufocam e pulam, infernalmente pulando.

Queria te dizer da tristeza de te mostrá-las assim tão cedo, mais cedo ou mais tarde você conheceria, mas não queria ser eu, sabe, esse fardo, só que me interessei muito por essa sua nova visão interrogativa, queria mostrar pro mundo, te levar aos congressos de doutores em letras, mostrar pra esses seres que de livre docência tem só o título, pra eventos internacionais sobre qualquer coisa assim e assado.

Dizer que tudo, e o mundo silenciaria, Pedro, você diria que tudo isso não passa de um S desatinado, que cansou do plural, viu o ponto, também não muito feliz sendo final, persuadiu-o, resolveram ser curva e bola, só.

Dois dois, nenhum: nem plural, nem final.

- Gabi Romeiro -

14.7.08

Ãh musga éh...

Como diria Nietzche "Depois do silêncio, a música é o que se aproxima mais de expressar o inexpressável". Diria que a música consegue transformar o que é abstrato e sem explicação, em uma representação física. Por comprimentos de ondas e deslocamento de ar, você consegue mergulhar no que músico queria expressar. Ódio, prazer, amor, saudade, fúria, etc. Tudo que palavras não conseguem explicar nem em um conjunto de milhares, a música com apenas 7 notas, e o silêncio entre elas, consegue, e com maestria. E não só explicar, te faz sentir e se emocionar como o artista. A batida da música guia os batimentos do seu coração, num instante seu corpo acompanha a música e o que antes era a expressão do sentimento, agora é o sentimento.

- Dudu -

6.7.08

Crescer...

"Quando somos crianças, somos um pouco de cada coisa. Artista, cientista, atleta, erudito. Às vezes parece que crescer é desistir destas coisas, uma a uma. Todos nos arrependemos por coisas das quais desistimos. Algo de que sentimos falta. De que desistimos por sermos muito preguiçosos, ou por não conseguirmos nos sobressair, ou por termos medo".

5.7.08

A vida é engraçada...

A vida é engraçada... engraçada não, essa não é a palavra certa. Ela é irônica. Incrivelmente irônica. Há alguns meses, só a idéia de dar uma caminhada mais rápida já me dava náuseas, quiçá pensar em correr. Nunca imaginei que um dia eu poderia dar alguns passos mais rápidos do que de uma caminhada até a cozinha. Porém agora, depois de correr 1 hora, por quase 7km tive uma das melhores experiências da minha vida. Correr por si só é uma das melhores coisas para se manter saudável, mas ela tem um outro ingrediente excelente para a saúde mental, Temos alguns minutos sozinhos com nós mesmo, só nós, nossas músicas e nossos pensamentos, e nessas horas os pensamentos filosóficos aparecem.

Partindo do princípio, uma das, senão a maior, dúvida da humanidade é o sentido da vida. Qual o sentido da vida? Por que acordamos todos os dias e simplesmente vivemos? Partindo do ponto que eu sou ateu, a minha vida é isso que vivo, depois disso acabou, simplesmente desligamos. E aí se complica ainda mais, qual o sentido da vida aqui na Terra? Se não há mais nada depois desse “martírio”, qual o sentido de viver algumas décadas e depois desaparecer?

Procuramos um sentido tão complexo para tudo, que não vemos o que há de mais belo: a simplicidade. Vivemos para sentir. Para sentir que estamos vivos. Essa deveria ser a sensação que deveria nos guiar pela vida, e não um pensamento de que algo transcendental deveria nos dizer o motivo de nossa existência. A filosofia trata de nos ajudar a viver, sabendo que nosso tempo na Terra é finito, e o tempo corre sem parar, sem chance de volta.
Por isso só temos o presente. O passado não existe mais, e o futuro ainda virá a existir, mas ainda assim vivemos a maior parte do tempo vivendo entre saudades e esperanças. Não nos damos contas que o único momento em que estamos vivos é o agora, e não amamos a vida como ela deveria ser amada.

Esperamos algo tão grande do futuro e vivemos tão frustrados com o que não fizemos ou não tivemos, que as maravilhas da vida se passam, a toda hora, sem a chance de serem re-vividas. O sentido da vida é sentir alguma coisa que nos faça parar e pensar “Que bom que estou aqui para sentir isso”. E não falo que essa sensação vem só com desejos megalomaníacos, mas com as coisas mais simples da vida. Lembro-me quando eu estava num trabalho num turno da madrugada, havia alguns meses que não saia mais com meus amigos, e isso me deixava extremamente deprimido, um dia não agüentei, pedi as contas e joguei tudo pro alto. Nesse mesmo dia saí com meus amigos, fui a uma lanchonete fuleira comer um lanche. Foi um dos dias mais felizes da minha vida, simplesmente por que me sentia vivo, como há muito não me sentia.

Mas lembrando aqui, algumas coisas que fazem eu me sentir vivo: Quando consigo correr 1 minuto a mais do que no dia anterior, quando estou com sede e olho pro lado e tem um copo d´agua, quando o meu rádio toca a música que eu queria ouvir aleatoriamente, quando viajo 400km para ver uma amiga especial, quando converso com alguém que gosto, quando beijo a menina que queria beijar, quando aprendo a fazer um acorde novo na guitarra, etc. Quase toda hora, vivemos pequenas coisas, pequenos sentimentos, que nem damos valor, porque esperamos que a vida seja algo realmente grande, mas que somadas nos fazem sentir vivos.

Isso é incrível, é tudo tão simples. Esperamos que uma roupa nova de marca, um carro, um computador, um outro lugar ou que outras pessoas venham nos suprir e mostrar o sentido da vida. Quando na verdade tudo que nos importa esta ao nosso alcance, mas olhamos tão para cima, que não vemos o nosso lado. Pensando assim, viver é sentir.

Vou pensar num outro lado, o lado profissional. Passamos no mínimo 1/3 da nossa vida adulta nos nossos empregos e outros 1/3 da vida no mínimo estudando para ter esse emprego, é muito tempo, tirando as nossas horas dormidas, é metade da nossa vida. Metade da nossa vida... quando se pensa assim, da para se ter uma idéia do tamanho da importância disso no sentido da vida, no sentir, no viver.
Procurando alguma segurança, vamos atrás de um bom emprego, com um bom salário, que nos traga um futuro promissor. Um futuro promissor... quando esse futuro vai chegar? O que mais vejo são pessoas acordando e indo pro seu emprego, como zumbis desprovidos de sentimento, realizar suas tarefas, voltar para casa, receber seu salário, comparar suas coisas, preencher seu vazio e esperar alguma coisa atravessar o céu, e dizer “Esse é o sentido da vida, agora sua vida tem sentido”. Não quero isso para mim. Confesso que faço parte dessa turma de zumbis, mas não quero isso, não para sempre, quero me sentir vivo até quando trabalho, assim como me sinto o resto do dia.

Quero sentir. Acordar e pensar “Que bom que estou vivo”. Penso que a vida é como uma paquera. As vezes temos medo de meter a cara e falar com uma garota. Temos medos de falar besteira e perdê-la e não fazemos nada. No final, além de não termos a garota, ainda temos aquelas frustração de não ter feito nada, e como já disse, o percurso do tempo não para. Agora gastaremos mais um pouco do nosso precioso presente para pensar no passado e dizer que no futuro não faremos isso. Temos tanto medo de errar, que não percebemos que somos frutos dos nossos erros. Não só dos nossos erros, mas das nossas experiências em geral, mas diria que dos erros principalmente, pois eles nos marcam mais e nos fazem aprender, a crescer e nos tornarmos mais fortes.

Nos queixamos tanto que “Se eu soubesse, não teria errado” e ao mesmo tempo criticamos “as pessoas vazias que tem tudo na mão e mesmo assim são umas idiotas”. Na vida é tudo tão simples, que os erros nos fazem sentir, nos fazem viver, viver nos transforma e no fim nos tornamos quem gostamos de ser. Se não tivéssemos errado, aprendido, sofrido, hoje seriamos aquelas pessoas que consideramos vazias. As vezes, o que achamos que foi nosso pior momento, foi a melhor coisa que nos aconteceu.

Eu quero errar, quero sofrer, quero aprender, quero sentir, quero viver. Não quero chegar nas vésperas da minha morte, olhar para trás e pensar “Era tudo tão simples, e eu simplesmente não vivi”. Quero me sentir tão vivo quanto agora que escrevo esse texto, quero escrever vários textos, quero conversar, beijar, sentir, quero ter milhões de sensações. Quero chegar no meu leito de morte e que todos digam “Esse cara viveu, tomou inúmeros tombos, mas viveu”. Não quero pensar que construí meu patrimônio vendendo seguros, ou advogando, ou algo do tipo. Há pessoas que gostam, e fico feliz que essas pessoas se sentiam vivas em fazer isso, mas eu não. Eu quero mais. Quero marcar alguém. Fazer as pessoas pensarem, refletirem, sentirem, viverem. Satisfazer-me em estar trabalhando, em acordar e ir feliz trabalhar, porque sei que lá vou ter sensações únicas e me sentirei vivo.
No fim, o grande sentido da vida é viver.


-Dudu-